"A cabeça pensa onde os pés pisam" Paulo Freire

terça-feira, 31 de agosto de 2010

Plebiscito Popular pelo limite da terra será realizado em setembro


Plebiscito Popular pelo limite da terra será realizado em setembro
por Assessoria de Comunicação FNRA

O Plebiscito Popular pelo limite da propriedade da terra será o ato concreto do povo brasileiro contra a concentração de terras no país, que é o segundo maior concentrador do mundo, perdendo apenas para o Paraguai. Esta consulta popular é fruto da Campanha Nacional pelo Limite da Propriedade da Terra, promovida pelo Fórum Nacional da Reforma Agrária e Justiça no Campo (FNRA) desde o ano 2000.

A campanha foi criada com o objetivo de conscientizar e mobilizar a sociedade brasileira sobre a necessidade e a importância de se estabelecer um limite para a propriedade. Mais de 50 entidades, organizações, movimentos e pastorais sociais que compõem o FNRA estão engajadas na articulação massiva em todos os estados da federação.

Cada cidadã e cidadão brasileiro será convidado a votar entre os dias 01 e 07 de setembro, durante a Semana da Pátria, junto com o Grito dos Excluídos, para expressar se concorda ou não com o limite da propriedade. O objetivo final é pressionar o Congresso Nacional para que seja incluída na Constituição Brasileira um novo inciso que limite a terra em 35 módulos fiscais, medida sugerida pela campanha do FNRA. Áreas acima de 35 módulos seriam automaticamente incorporadas ao patrimônio público e destinadas à reforma agrária.

"A Campanha da Fraternidade deste ano também propõe como gesto concreto de compromisso a participação no plebiscito pelo limite da propriedade. Um limite para a propriedade faz parte de uma nova ordem econômica a serviço da vida", afirmou Dirceu Fumagalli, membro da coordenação nacional da CPT. Para ele, uma consulta popular, mais do que obter resultados concretos com a votação, é um processo pedagógico importante de formação e conscientização do povo brasileiro sobre a realidade agrária. "São milhares de famílias acampadas à espera de uma reforma agrária justa. São índices crescentes da violência no campo. É o crescimento desordenado dos grandes centros urbanos. Tudo isso tem relação direta com a absurda concentração de terras no Brasil."

Segundo Luiz Claudio Mandela, membro da coordenação colegiada da Cáritas Brasileira, os promotores do plebiscito querem dialogar com a sociedade sobre a concentração de terras no Brasil. "Isso interfere na estrutura política, social, econômica e geográfica do país", ressaltou. De acordo com Mandela, durante toda a campanha estão sendo coletadas assinaturas para que esta proposta seja convertida em um projeto de iniciativa popular. "Para isso precisamos de, no mínimo, 1,5 milhão de assinaturas. Mas pretendemos superar esta meta."

Outras informações:

Por que limitar as propriedades de terra no Brasil?
Porque a pequena propriedade familiar, segundo dados do Censo Agropecuário do IBGE 2006:
  • Produz a maior parte dos alimentos da mesa dos brasileiros: toda a produção de hortaliças, 87% da mandioca, 70% do feijão, 46% do milho, 38% do café, 34% do arroz, 21% do trigo; 58% do leite, 59% dos suínos, 50% das aves.
  • Emprega 74,4% das pessoas ocupadas no campo (as empresas do agronegócio só empregam 25,6% do total.)
  • A cada cem hectares ocupa 15 pessoas (as empresas do agronegócio ocupam 1,7 pessoas a cada cem hectares).
  • Os estabelecimentos com até 10 hectares apresentam os maiores ganhos por hectare, R$ 3.800,00.
Enquanto a concentração de terras no latifúndio e grandes empresas:
  • Expulsa as famílias do campo, jogando-as nas favelas e áreas de risco das grandes cidades;
  • É responsável pelos conflitos e a violência no campo. Nos últimos 25 anos, conforme a Comissão Pastoral da Terra (CPT):
·
    • 1.546 trabalhadores foram assassinados e houve uma média anual de
    • 2.709 famílias expulsas de suas terras!
    • 13.815 famílias despejadas!
    • 422 pessoas presas!
    • 765 conflitos diretamente relacionados à luta pela terra!
    • 92.290 famílias envolvidas em conflitos por terra!
  • Lança mão de relações de trabalho análogas ao trabalho escravo. Em 25 anos 2.438 ocorrências de trabalho escravo foram registradas, com 163 mil trabalhadores escravizados.
Procure por maiores informações em http://www.limitedaterra.org.br/

sábado, 28 de agosto de 2010

O que Cuba não tem que nós temos?

Celulares supermodernos; carros de ultima geração; novelas nacionais; o melhor futebol do mundo; o maior carnaval do mundo; feijoada; possibilidade de “ascensão social”; livre iniciativa privada; brigadeiro; TV digital de alta definição; computadores modernos; mansões; shopping center; Mc Donalds; a possibilidade de fazer quase tudo o que quiser se tiver dinheiro; fome; crianças na rua pedindo dinheiro; um dos maiores níveis de desigualdade social do mundo; dívida pública impagável; desemprego; saúde privatizada; educação privatizada; favelas; analfabetos; violência descontrolada; alta mortalidade infantil; trabalho escravo nos latifúndios; trabalho infantil; os políticos mais corruptos do mundo; meios de comunicação privados; monopólio de multinacionais; etc...

sábado, 21 de agosto de 2010

Cusco em greve!!!

No dia 27 de julho de 2010 o povo de La Convención, província da Região de Cusco/Peru, resolveu iniciar uma greve sem data para terminar contra a exportação do gás de Camisea.


No Peru se paga pelo gás mais caro do mundo. Na província de La Convención paga-se até 50 soles (cerca de 18 dólares) pelo botijão. Sem dúvida o gás mais caro em termos relativos (se considerarmos que o salário mínimo no Peru é cerca de 215 dólares). A grande contradição de pagar pelo gás mais caro do mundo é o fato de essa província ser grande produtora de gás, inclusive exportadora.


Alan Garcia, atual presidente do Peru e defensor da exportação do gás em benefício do consorcio Hunt Oil-Repsol-Pluspetrol, ordenou desde o primeiro dia a repressão aos grevistas e agora que a luta se estende e aprofunda, declarou Estado de Emergência e enviado tropas.



O conflito surgiu faz mais de um mês quando o consórcio iniciou a exportação do gás. O grande problema foi que se passou a priorizar a exportação em relação ao abastecimento interno. Cobra-se preços escandalosos pelo gás. O preço de exportação é cinco vezes menor que pagam os usuários peruanos (0,5 dólares por milhão de BTU frente a 2,5) e é vendido no mercado internacional por oito ou até dez vezes mais.

Os trabalhadores alegam que esse gás poderia estar sendo usado para calefação ou o seu recurso poderia estar sendo utilizado para comprar moradias dignas, de modo a combater o fenômeno da friagem que já matou 407 pessoas, sobretudo crianças.

Depois de 11 dias de luta localizada e com a cidade de Quillabamba totalmente parada, os quillabambenhos resolveram ir à cidade de Cusco, capital da Região com as reivindicações principais de nacionalização do gás no Peru e o fim da exportação dos lotes 88 e 56 de Camisea para abastecimento interno.


Marchas pacíficas foram realizadas diariamente, recebendo o apoio da população através de aplausos e doação de água e comida dos comerciantes locais. As forças foram somando-se, principalmente com a adesão dos estudantes da Universidad Nacional San Antonio Abad del Cusco, que realizaram uma marcha com cerca de 1000 pessoas, que somada aos trabalhadores chegou a mais de 2000 na praça de armas, principal praça de Cusco.


No dia 9 de agosto os dirigentes dos movimentos que estavam encabeçando a greve se reuniram com um grupo de ministros. Mesmo contra a vontade dos grevistas, dispostos a fazer a greve até que o governo nacionalizasse as reservas, os dirigentes deram ao governo 30 dias para que um grupo de técnicos avalie a situação. Caso o governo não tome nenhuma medida até o dia 9 de setembro, as mobilizações voltaram e a promessa é de que haja um paro nacional.


Esperaremos o dia 9 de setembro!

domingo, 8 de agosto de 2010

1959: o ano da Revolução

1959: o ano da Revolução

Em 1959 as coisas começaram a mudar
O que era novo passou a ser velho
Parecia que tudo iria se transformar
Um novo espectro estava no ar

Algumas tentativas já haviam sido feitas
Nem todas perdidas
Mas nenhuma perfeita

Eu poderia estar falando do dia 1º de janeiro
Dia da chegada à Sierra Maestra
Mas não.
Estou falando do dia 08 de agosto
Dia do nascimento da minha mestra...

Sandra,
Que drena o amor e a sabedoria e os transforma em leite
Leite que se mama da mama da mãe...

Sandra. Ah Sandra!
Que ingenuidade achar que pode chamar o seu filho de Theo
Só porque eres uma Deusa.




Mãe,

essa é uma pequena homenagem do seu filho, que hoje está distante e sem dinheiro, em um dia que seria como todos os outros se você não tivesse nascido nele 51 anos atrás. Um poema sem qualquer tipo de regras poéticas e com rimas pobres. Mas eu acho que tenho licença poética para isso porque escrevo não com a preocupação gramatical, mas sim com a preocupação de demonstrar a admiração e o amor que sinto por você.

Lembro que quando eu era criança te dizia mais de cinco vezes por dia que te amava e isso se perdeu. Acho que a nossa sociedade faz isso com a gente. Então tratemos de mudar! Ela e nós!

TE AMO!!!
TE AMO!!!
TE AMO!!!
TE AMO!!!
TE AMO!!!
TE AMO!!!

Feliz aniversário do seu caçula,

Theo.

Cusco, 08 de agosto de 2010.

segunda-feira, 2 de agosto de 2010

Como deve ser o Sistema de Saúde?

Uma viagem como a que estamos fazendo implica em mudanças constantes. De altitude, de pressão, de temperatura, de alimentação, etc. Muitas vezes essas mudanças somadas se transformam em doenças e seus sintomas: febre, diarreia, dor de cabeça, dores musculares vômito, etc. Quando a situação não está mais tão controlável procuramos um hospital.

Separei algumas situações em que tivemos que ir ao hospital para que se perguntem como deve ser o sistema de saúde de um país.


Situação 1

- Lugar: Caimito (cidade pequena cerca de 30 minutos de ônibus de Havana)/Cuba

- Sintomas: dores musculares e princípio de febre

Estávamos saindo do acampamento em Caimito rumo a Havana carregando nossas pesadas mochilas. Como o Daniel não se sentia muito bem, resolvemos parar no hospital da pequena cidade para tentar descobrir o que tinha. De imediato fomos atendidos. Logo depois de 2 horas e de terem feito todos os tipos de exames possíveis no corpo do Daniel, saímos com uma receita médica para comprar antibióticos em uma farmácia, em que os remédios são subsidiados, e sem gastar um real.


Situação 2

- Lugar: Caracas/Venezuela

- Sintomas: manchas vermelhas pelo corpo

Estávamos há um dia em Caracas e nos apareceu diversas pequenas marcas vermelhas no corpo, principalmente nos braços. Já que estávamos passeando e conhecendo a Missão Barrio Adentro, resolvemos entrar e conversar com um médico para tentar descobrir se aquilo era alergia, ou o que era. Imediatamente fomos atendidos por médicos cubanos que ao olharem as manchas disseram que não era alergia e sim picadas de mosquitos. Só na noite seguinte é que fomos perceber que haviam milhares de mosquitos na sala de aula aonde estávamos dormindo na UBV. Saímos de lá sem gastar um real.


Situação 3

- Lugar: Lima/Peru

- Sintomas: diarreia e vômito

Uma noite o Daniel se sentiu mal e não conseguiu dormir porque teve muita diarreia e vomitou. Saímos de casa às 6h30 da manhã para um hospital. Chegamos lá e havia uma fila um tanto quanto grande e parecia estar fechado. Aproximamo-nos e Daniel perguntou a um senhor na fila se o hospital estava fechado e ele disse que sim e que só abria às 8h da manhã. Voltamos para casa para descansar e lá pelo meio dia voltamos ao hospital. Depois de nos mandarem a uma sala, nos mandarem voltar para o lugar que estávamos, voltar para a sala que estávamos uma vez mais, um médico atendeu o Daniel. De imediato lhe deu uma receita para que comprasse soro e instrumentos, como seringa e mangueira, em uma farmácia que estava dentro do hospital. Aí já se foram 27 soles. Só depois de comprar o soro e os instrumentos é que lhe colocaram numa maca para tomar o soro. Em seguida o médico me deu um papel com o qual eu deveria ir ao caixa e pagar algumas coisas. Paguei 8 soles por serviços e mais 8 soles pela consulta. Ao acabar o soro, o médico me pediu que comprasse outro tipo de soro para o Daniel beber e ver se o corpo aceitava bem. Aceitou, mas não foram necessários os 1000 ml da garrafa de tamanho único, senão um copinho. Nessa se foram mais 6 soles. No final das contas saímos com uma receita de um antibiótico e com 51 soles (equivalente a 35 reais) a menos. O hospital chamava-se Hospital da Solidariedade, o que a princípio me pareceu um pleonasmo, mas longe disso, era uma antítese.

Deixo para que as pessoas que leram essas situações de três países em processos diferentes (um país socialista, um país construindo uma revolução socialista e um país ainda em plena transformação rumo ao neoliberalismo) reflitam sobre como deve ser o serviço de saúde de um país. Se devemos ser clientes ou pacientes.

Monte às avessas - Cerro de Pasco

No dia 29 de julho decidimos encarar a dor de cabeça e o frio, causados pelos mais de 4300 metros de altitude e pela sensação térmica de -10ºC, para conhecer Cerro de Pasco e o desenvolvimento da extração de minérios na região. Cerro de Pasco é a capital da província de Pasco, cerca de sete horas de viagem ao norte de Lima, e que apesar de possuir somente cerca de 78 mil habitantes, possui a desagradável presença de oito grandes empresas estrangeiras ligadas à extração e à manipulação de minérios.


Ao chegarmos em Cerro de Pasco fomos recebidos por Victor Parodi Bojar da Federação Regional de Comunidades Camponesas e Nativas de Pasco (FERECCNPA), contato que fizemos em Lima na Coordenadora Nacional de Comunidades do Peru Afetadas pela Mineração (CONACAMI).


Victor nos levou para conhecer o "buraco" Tajo Raúl Rojas que existe no centro da cidade, fruto de mais de um século de extração de minérios na região. Enquanto se cavava, a terra e as pedras que não possuíam minérios eram levadas para as partes mais baixas da cidade. O que era serra virou um buraco, e o que era pampa, virou serra.



O "buraco" já possui cerca de 1km de profundidade, mas a ideia da transnacional responsável não é parar por ai. Quase todas as casas e propriedades a sua volta já foram compradas pela empresa para expandir a exploração. Nem todas foram vendidas porque algumas pessoas resistem, como o caso do senhor Marcelo Rosas Sanchez, de mais de 60 anos e que vive na cidade desde pequeno. Victor nos apresentou ao seu Marcelo e ele nos acompanhou no "tour" pelo "buraco".

Da esquerda à direita: Victor, Marcelo e Daniel

Seu Marcelo é um senhor simples e falador. Nos contou um pouco da história do Perú e da exploração de minérios na região de Pasco desde a colônia. Enquanto nos mostrava as consequências da mineração, nos contou um pouco da sua vida e do filho que estudou medicina em Cuba e que hoje está no Haiti.


Enquanto dávamos a volta no "buraco", seu Marcelo foi nos contanto também os motivos pelos quais ainda permanece em sua casa, cerca de 20 metros da propriedade da transnacional.


O principal motivo pelo qual resiste, segundo ele, é por ser patriota e contrário a que uma transnacional explore o território peruano, levando riqueza e deixando miséria e poluição. Por algumas vezes ele nos repetiu que não suportava Fujimori (hoje preso pelos anos de assassinatos da sua ditadura nos anos 1990 e que implementou as reformas neoliberais no país), entre tantas outras coisas, por este ter cedido território peruano ao Chile e por ter vendido empresas peruanas a empresários estrangeiros.

Porém, nem todos os vizinhos do seu Marcelo pensam como ele. Isolado em sua resistência e agora também das outras pessoas da cidade, já que não possui mais vizinhos nem comércio a sua volta, seu Marcelo vê-se obrigado a deixar a sua casa. No entanto, deixar a sua casa não é uma atitude tão simples como parece. Isso porque ele alega que o valor que a empresa quer pagar pelo seu terreno é inferior ao que ele necessitaria para comprar uma casa igual em uma região mais ao centro da cidade ou afastada do "buraco".


Casas desabrigadas vendidas à mineradora

Porém, a expulsão, forçada ou não, dos moradores do centro de Cerro de Pasco, ainda que um grave problema não é o maior. O maior problema hoje é a contaminação das terras e dos rios com metais pesados, que afeta toda a população, principalmente os camponeses criadores de animais, que vivem ao redor da cidade.



Victor nos levou então para uma região mais afastada do centro de Cerro de Pasco, onde são visíveis os problemas ambientais causados pela mineradora. Somente pela cor da água, contaminada com cobre, pode-se ver a diferença.



Segundo o Boletim da FERECCNPA nº1: "A problemática socioambiental em Pasco é preocupante. Uma vez por semana a população tem acesso a água (somente por uma hora), em muitos setores a água não é tratada, tem coliformes fecais (informes de Diresa Pasco) e se consome água com metais pesados. Em nossa cidade as crianças estão contaminada com chumbo; segundo estudos da Censopas em Quiulacocha e Champamarca existem mais de 236 crianças intoxicadas. Diresa recomenda que as zonas indicadas devem ser desabitadas por causa da alta porcentagem de substâncias mineralizadas, assim como o nosso distrito de Chaupimarca que diariamente convive com a expansão do Tajo Raúl Rojas".


A cada passo a mais que damos em nosso continente, nos surpreende cada vez menos pelo fato de que cidades e países com tanta riqueza estejam tão destruídos e sejam tão pobres. Quanto mais conhecemos os nossos irmãos vizinhos, mais eles se parecem semelhantes e mais vemos que ainda existem muitas veias abertas por nossa América Latina.


* Agradecimentos especiais a Victor e seu Marcelo por dedicarem sua sexta-feira de feriado para nos mostrar a cidade e aos pais do Daniel, Roseli e Geraldo, por deixarem a camêra fotográfica e o notebook, depois de uma visita em Lima.