"A cabeça pensa onde os pés pisam" Paulo Freire

terça-feira, 23 de março de 2010

Final de fevereiro, começo de março

No último dia de fevereiro fomos convidados a ir à praia com alguns estudantes da Universidade Bolivariana, de um coletivo chamado Juventude Rebelde, e com alguns estudantes secundaristas, militantes do PSUV em suas comunidades. Foi um dia normal de praia: areia, mar, sol e costas ardendo, porque esquecemos o protetor, apesar dos avisos da Roseli (mãe do Daniel).

Lá conversamos com os estudantes secundaristas e nos disseram os trabalhos que ralizavam na comunidade e de que apoiavam Chávez, mesmo que seus país não gostassem dele. Ocorreu um episídio, aparentemente simples, mas que para mim foi muito marcante. Em uma conversa com uma menina de 15 anos, estavamos falando de escravidão e ela nos disse que a Venezuela havia sido o último país na América Latina a acabar com ela. Eu, esperto que sou, sabia que a última abolição havia sido decretada no Brasil e não na Venezuela. Perguntei então à ela quando havia sido a abolição na Venezuela, já com a resposta na ponta da língua de que a do Brasil teria sido depois. Foi então que ela disse: "aqui foi em 1989" (se referindo ao Caracaço). A única atitude que me coube então foi ficar quieto.

No dia primeiro de março chegaram à Universidade Bolivariana um grupo de cerca de 20 baianos, entre estudantes e motoristas do ônibus que os transportava. Os estudantes da Universidade Federal da Bahia haviam se organizado e planejado um projeto de uma viagem de 2 meses pelos países da América do Sul, saindo pelo Paraguai até a Venezuela, com o objetivo de conhecer as diversas culturas e trocar experiências com os povos da nossa América. Fica ai uma boa dica pros estudantes de outras universidade.

Tivemos pouco tempo para conversar e caminhar por Caracas com eles, pois eles ficaram somente mais 3 dias em Caracas e voltaram de avião para a Bahia, uma vez que as aulas da universidade iniciariam. No tempo em que ficamos com eles, participamos, com um relato da idéia da nossa viagem, de dois documentários que estavam sendo filmados ao longo da viagem.

Nos dias seguintes fomos à Universidade Central em uma atividade contra o Apartheid na Palestina, em que foi exibido um documentário sobre a destruição causada pelas bombas do exército israelense, e a uma maniestação que passou por algumas faculdades dentro da universidade, com palavras de ordem e colocando cartazes contra a expulsão de alguns estudantes e aos portões que a reitora pretende colocar nas entradas da universidade.



Alguns estudantes da Universidade Central estão sendo julgados e correndo o risco de serem expulsos da universidade por terem participado de uma manifestação em que arrancaram os portões colocados pela reitoria nas entradas da universidade, medida que pretende controlar o acesso à universidade, um espaço que teoricamente é de toda a comunidade e em que existe um hospital público.

A Reitora, com uma sequência de medidas autoritárias, persegue os estudantes por serem chavistas e por isso tem respaldo de grande parte do corpo docente e dicente, na sua maioria esquálidos (nome dado aos contra-revolucionários), principalmente na Faculdade de Odontologia, faculdade a qual a Reitora é professora e aonde está localizado o centro da organização esquálida, onde fomos vaiados e chingados durante a manifestação, enquanto gritávamos: "¡La UCV es del pueblo, no de la burguesia!".

No dia seguinte, 04/03, participamos de uma atividade sobre o Caracaço, em que passaram um documentário sobre o período precedente ao Caracaço, seguido de relatos de pessoas que le lembravam daquela época e de um debate sobre suas causas e consequências. Nesse mesmo dia, conhecemos um jovem no refeitório. Ele sentou-se ao nosso lado e escutando falarmos um pouco rápido nos perguntou se éramos árabes (acho que por causa do nariz do Daniel, na verdade). Logo começamos a conversar, já que ele também gostava muito de futebol. Em meio a conversa ele nos disse que seu pai estava preso. Disse que seu pai trabalhava em uma empresa grande que fazia câmbio e comprava ouro e que foi nacionalizada porque foi descoberto que havia corrupção. Com as investigações, seu pai, os donos e alguns outros funcionários foram presos. O jovem acredita que seu pai é inocente e logo será solto, uma vez que não estava envolvido com todo o esquema. Mesmo considerando que o governo falhou ao prender seu pai, ele defendia firmemente a nacionalização da empresa e o governo dizendo que é um governo revolucionário, que estão ocorrendo muitas transformações sociais e que graças a isso ele e grande parte da população pobre estão podendo estudar em uma universidade pública como a UBV. Ao invéz de culpar cegamente o governo, o que não é muito difícil com todo o massacre diário da grande mídia venezuelana e mundial, por conta do que ele acredita ter sido uma falha, ele sobrepôs o processo revolucionário e todas as transformações sociais que vêm ocorrendo na Venezuela, ou seja, aspectos coletivos, a um assunto estritamente individual. Está ai um grande exemplo.

Nenhum comentário:

Postar um comentário